sábado, janeiro 31, 2009

Em defesa do jurista brasileiro

Pivô de uma briga internacional, o italiano Cesare Battisti obteve o status de “refugiado político” por decisão do Ministro da Justiça Tarso Genro, o que ensejou severas críticas por parte do deputado italiano Ettore Pirovano, do partido conservador Liga Norte, o qual recentemente alfinetou: "Não me parece que o Brasil seja conhecido por seus juristas, mas sim por suas dançarinas. Portanto, antes de pretender nos dar lições de Direito, o ministro da Justiça brasileiro faria bem se pensasse nisso não uma, mas mil vezes" (veja aqui a notícia).

Particularmente, creio que Cesare Battisti esteja bem distante de ser um “perseguido político” pelo governo italiano e penso que o Ministro da Justiça tomou uma decisão equivocada, porém, de certa forma, até corajosa e bastante coerente com a política de seu partido, que abriga diversos “ex-revolucionários” como o próprio Battisti, em suas fileiras

O Ministro Tarso Genro, além do mais, vem pecando ao tecer críticas ao governo da Itália, como a provocação desnecessária de
que o país ainda vive fechado em seus “anos de chumbo”.

Por outro lado, o deputado italiano Ettore Pirovano perdeu uma excelente oportunidade de ficar calado ao ofender o Brasil e tentar denegrir os juristas brasileiros.

Verdade seja dita, o Brasil é bem mais conhecido lá fora pela música, pelas suas dançarinas, pelas novelas e pelo Carnaval, do que por seus juristas. Aliás, para a maioria da população dos países europeus e dos Estados Unidos da América, a capital brasileira é o Rio de Janeiro ou Buenos Aires, falamos o idioma espanhol, somos um povo que vive em eterno e lúdico Carnaval durante os 365 dias do ano, com muito samba, mulatas dançando e cachaça aos montes; vivendo no meio do mato e, de vez em quando, se desviando de ataques de índios furiosos...

Mas, por sua vez, da mesma forma, seria possível lembrar ao nobre deputado italiano que seu país é conhecido bem mais pelo seu espaguete, pelo futebol (cujas equipes são recheadas de jogadores brasileiros), e, de maneira mais lamentável, pela sua Máfia, exemplo do secular crime organizado italiano, que inspirou tantas outras organizações criminosas semelhantes no resto do mundo.

Todos os países carregam seus estereótipos e com o Brasil não é diferente. Nem mesmo com a Itália...

Berço da civilização européia, a Itália descende do que outrora foi o Império Romano, que espalhou por quase toda a Europa o seu direito, as suas leis e os seus costumes. A raiz do Direito Brasileiro, aliás, tem origem no antigo Direito Romano, como igualmente ocorre em Portugal, Espanha, França, Alemanha, entre outros países.

Diferentemente ocorre, a exemplo, nos Estados Unidos da América e na Inglaterra, que têm o seu sistema judiciário e jurídico baseado no Direito Anglo-Saxônico. Por essa razão, quando nos deparamos na televisão com filmes e seriados norte-americanos e britânicos envolvendo advogados, notamos e estranhamos que, nesses países, a instituição do júri é aplicada em quase todos os casos, de danos até homicídio (ao contrário do Brasil, em que o tribunal do júri apenas julga os crimes dolosos contra a vida), com onze jurados (em vez de sete, como aqui acontece), com advogados sempre falando, debatendo e se confrontando (o que acontece em menor escala entre nós), baseando-se mais em jurisprudências (enquanto que em nosso país damos maior ênfase à legislação e sua interpretação), entre outras diferenças.

Temos, assim, que reconhecer a Itália como sendo o lugar de nascimento do que hoje entendemos por Direito Brasileiro, e berço de Cícero, um dos primeiros advogados.

Portanto, me causa estranheza que o governo italiano se insurja contra instituições bem semelhantes às de seu próprio país, que, por sinal, ensinou a ciência do Direito ao mundo, inclusive ao Brasil (o qual, diga-se de passagem, foi um de seus melhores alunos)...

Não me surpreendo, no entanto, que o nobre deputado Ettore Pirovano desconheça nomes como o de Rui Barbosa, grande advogado, renomado jurista, cujo nome ainda é celebrado no Brasil e no exterior (inclusive na Itália) como uma das maiores mentes que o mundo já produziu.

Brasil e Itália, portanto, têm em comum não apenas a origem de seu Direito, mas também o fato de ambos possuírem uma quantidade considerável de políticos falastrões, de instrução limitada e reduzida cultura...

Não creio, por fim, que o Ministro Tarso Genro siga o conselho do excelentíssimo deputado italiano de “pensar mil vezes” no assunto. Primeiro, porque se trata de uma decisão calcada na política partidária (que, infelizmente, muitas vezes se confunde com a do próprio governo vigente). Em segundo, porque, voltar atrás na posição significaria o desprestígio do Ministro da Justiça e sinalizaria ao resto do mundo que o Brasil não tem convicções e que é vulnerável às pressões políticas externas. E, em terceiro, porque pensar uma vez já dá muito trabalho,... imagine “mil vezes”...

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